De pé é mais engraçado
A tradição americana da stand-up comedy, baseada na observação do cotidiano, começa a conquistar o Brasil
RECORDE O mineiro Bruno Motta passou mais de 38 horas contando piadas. Entrou para o Guinness Book |
Acena se repete em filmes e séries americanos. Num bar, um comediante sobe ao palco e, sozinho diante do microfone, faz observações hilariantes sobre o cotidiano. Há cerca de dois anos, esse gênero de humor, chamado stand-up comedy, vem ganhando força em grandes cidades brasileiras. Ao contrário da comédia que sempre fez sucesso por aqui, calcada em piadas formais e personagens histriônicos, a stand-up comedy explora a familiaridade do público com os temas e a improvisação. Astros americanos como Woody Allen, Tom Hanks e Jim Carrey começaram as carreiras no stand-up, que é a porta de entrada da maioria dos comediantes dos Estados Unidos para a televisão e o cinema. Jerry Seinfeld é o maior ícone desse gênero de humor - e ídolo da maioria dos brasileiros que agora tentam seguir seu caminho.
No Rio de Janeiro, o Clube da Comédia em Pé tem lotado dois teatros desde janeiro, quando estreou. No início deste mês, os quatro membros do clube - os atores Fernando Caruso, Fábio Porchat, Paulo Carvalho e o redator Claudio Torres Gonzaga - passaram a ocupar, aos sábados e domingos, o horário nobre de uma das salas do cinema UCI do shopping New York City Center, também na Barra. Em vez de filme americano, stand-up comedy brasileira. A idéia, inédita no Brasil, repete a experiência feita pela empresa em Londres e Buenos Aires.
Clube da Comédia | |
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Hoje está no Bleecker Street, na Vila Madalena, em São Paulo, onde cabem 350 pessoas. Apresentam-se às segundas-feiras, às 21 horas, e aos domingos, às 18 horas e às 21 horas “Às vezes, me perguntam se gosto de andar de avião. Não sei responder isso, porque sempre que estou lá o avião só anda um pouquinho. O resto do trajeto ele vai voando” |
Gonzaga é redator-chefe do Zorra Total, da TV Globo, um programa cujo tipo de humor é o oposto da comédia em pé. Ele criou regras para seu grupo, de forma a aproximá-lo da raiz do stand-up: o comediante tem de se apresentar sozinho; deve ser autor do próprio texto; não pode interpretar um personagem ou usar um figurino diferente das roupas do dia-a-dia; não pode contar casos ou piadas conhecidas; por fim, é proibido lançar mão de cenografia, trilha sonora ou sonoplastia. Difícil? "A força está no texto. Muitas vezes o público aplaude mais a observação inteligente, com o que ele se identifica, que o engraçado", afirma Gonzaga.
Se, no Rio, o stand-up ocupa teatros e cinema, em São Paulo dois grupos provocam gargalhadas em bares. Há dois anos, o Clube da Comédia Stand-Up faz shows em diversas casas paulistanas. Seis comediantes dividem o palco. Cada um tem um tempo de cinco a 15 minutos. A outra trupe de São Paulo é a Comédia Ao Vivo. Também funciona no esquema de clube, com um elenco fixo de quatro atores que se revezam no palco. Além da organização em "clubes" e de regras bem parecidas, os grupos fazem intercâmbio. Uns são convidados nas apresentações dos outros. Outro ponto comum é não fazer shows iguais. Cada apresentação tem textos novos, o que ajuda a garantir a casa cheia. "Mas, às vezes, alguns textos fazem tanto sucesso que a platéia pede para repetir, e as piadas acabam ficando fixas", diz Fábio Rabin, de 25 anos, do Comédia ao Vivo.
Comédia Ao Vivo | |
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Formado no início deste ano, o grupo está no Bar Ao Vivo, em Moema, São Paulo “‘O amor é mais forte que a morte’, afirma o papa na Vigília Pascal. Como o Sumo Pontífice pode falar com tanta certeza de duas coisas que não entende? Aposto |
No circuito dos clubes de stand-up nacionais está um mineiro que atua sozinho, Bruno Motta, de 26 anos. Há pouco mais de um ano, ele entrou para o Guinness Book como o comediante que fez o "maior show de humor do mundo". Ficou 38 horas e 12 minutos falando para um público de 5 mil pessoas que se revezavam num teatro em Belo Horizonte. Hoje, Motta vive do que ganha em seus shows e também em palestras em empresas de todo o Brasil. Outros comediantes de stand-up têm sido contratados para palestras, sozinhos ou em grupo. O ator Oscar Filho, do Clube da Comédia Stand-Up, faz dez eventos empresariais por mês. "Num deles fui contratado para alguma coisa engraçada sobre a internet", diz. Trabalhou um minuto e ganhou R$ 500.
Diogo Portugal, um dos membros do Clube da Comédia Stand-Up, está lançando um audiolivro com o mesmo nome do grupo. Curitibano, ele é o criador do evento Risorama, um festival de humor que já teve três edições na capital paranaense. O carioca Fernando Ceylão vai lançar, até o fim do ano, o livro de seus melhores textos. Ceylão, de 29 anos, não pertence hoje a nenhum grupo, mas é um dos expoentes brasileiros do gênero. Foi o primeiro não-americano a ter participado do festival de stand-up do American Comedy Institute, em Nova York. Hoje, é diretor teatral e não faz mais shows. "O stand-up tem tudo para fazer sucesso no Brasil, mas chega uma hora que já se falou de tudo", afirma. Enquanto não esgotam o repertório, os clubes da comédia em pé fazem história no Brasil.
Comédia em Pé | |
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Às quartas e quintas-feiras, está no Laura Alvim, em Ipanema, com direito a show de jazz antes do espetáculo. Às sextas e aos sábados, o grupo tem se apresentado em cinemas da Barra da Tijuca “Vocês já repararam que hoje em dia toda mulher fez ou quer fazer escova progressiva? Para quê? Para ficar com a cara entre parênteses!” |
Três comediantes que se consagraram | |
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JERRY SEINFELD É o maior símbolo da stand-up comedy e ídolo em todo o mundo. Adaptou o gênero para a TV no que é considerado o melhor seriado da História. |
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JIM CARREY Como a maioria dos comediantes americanos, começou sozinho no palco com o microfone, assim como Woody Allen, Jay Leno e Eddie Murphy.
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JOSÉ VASCONCELOS Foi um dos precursores do estilo no Brasil. Jô Soares e Chico Anysio também fizeram muitos shows desse tipo nas décadas de 70 e 80. |
Martha Mendonça |
Fotos: divulgação, Andre Nazareth/ÉPOCA, Evelson de Freitas/AE e Michael Dwyer/AP |
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